quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

O HACKER E OS PONTEIROS by Angeli


Há alguns dias, João Sperandio Neto
foi preso em São Paulo. Confessou, além de
outras façanhas, ter invadido o sistema de um grande
banco e em menos de dez dias ter desviado ao menos
2,2 milhões de reais, que distribuiu aleatóriamente
por aí. Em 2004 já se sabia que ele havia desviado cerca
de 10 milhões e, segundo ele, teve que dar dinheiro a
policiais e bandidos.


João, em entrevista ao Fantástico, que concedeu
sem mostrar o rosto. Sábia decisão.



Há alguns dias: em cana




João e sua arte: senhas bancárias dentro
de um computador na Guatemala sem que o
próprio dono da máquina soubesse.

João tem 22 anos e começou com 15, por brincadeira.
Foi sequestrado cinco vezes por marginais e polícia.
Dizem,de João, que é um caixa eletrônico com pernas.
Seus feitos são impressionantes, realmente.
Invadiu sites de universidades, bancos daqui do Brasil,
da Inglaterra, Estados Unidos. Diz calmamente que
em qualquer sistema existem buracos, falhas, que
podem ser usadas para invasão.
"Ele consegue descobrir lacunas que técnicos experientes
não conseguem enxergar”
, diz o delegado Luiz Storni,
que o interrogou.



Na realidade foi isso, além do fato de João ter
dificuldade para ver as horas em relógios com ponteiros -que
o confundem- que me levou a escrever este post.
Além dos ponteiros, outra dificuldade que João admite
são os textos, que tem que reler e reler sem
conseguir compreendê-los imediatamente.
Em 1990 fiz minha primeira exposição sobre São Paulo,
com uma técnica bem diferente da que tenho
hoje. O tema foi a Avenida Paulista, sempre de
madrugada. Por acaso, uma galeria da própria
avenida se interessou pelos trabalhos e a mostra foi
realizada lá mesmo.



O final da Consolação e início da Paulista,
em 1990. A técnica das pinturas é aerógrafo
e acrílico sobre canvas.
As obras tem 120x120 cm.

Na vernissage, muitos dos presentes eram executivos
ou pessoas que passavam diáriamente pela avenida,
indo para o trabalho ou voltando dele.
Observando minhas pinturas, havia sempre um comentário
frequente dessas pessoas que acabou chamando
minha atenção e que me faz pensar até hoje.



O acesso á Doutor Arnaldo e o Emílio Ribas,
madruga em 1990. Esta última tela pertence
ao Milton, meu brother.

Elas diziam, surpresas, que passavam todos os
dias por aqueles locais e viadutos que eu havia
pintado mas jamais haviam notado como eram
realmente, em alguns dos detalhes que eu havia pintado.


O muro do cemitério da Consolação, em São Paulo.
Muita gente gostou dessa obra, mas desistiam quando
descobriam qual era o tema.
Incrível.


O amanhecer de um novo dia em 1990 e o catador
de papéis, muro do cemitério na Consolação.
Esta tela pertence à André Bomilcar, e deve
estar no Rio de janeiro, atualmente.


Isso nos leva novamente à João, o hacker.
Algumas pessoas tem seu foco, sua visão da vida,
-ou sintonia- em detalhes, imagens, ou conceitos, talvez,
que a maioria das pessoas não consegue enxergar.
Ou não vê, simplesmente, pela correria em que andam,
por terem sido treinados para enxergar apenas um lado
das coisas. A própria mídia se encarrega de ir
enfiando na cabeça das pessoas, geralmente, o que
é bacana de se ver ou não. O que é in, o que é out.
A maneira correta de agir, se vestir,
amar, conversar...e até pensar.
Crianças normalmente não sofrem e não obedecem
à essas imposições, e frequentemente nos surpreendem
com uma visão totalmente nova sobre um
assunto qualquer, geradas pela sua intuição,
muito forte quando somos pequenos ainda.
Com o tempo isso se perde.
Mas não para todos. João é a prova disso.
Ele enxerga com naturalidade detalhes e particularidades
que passam desapercebidos até por experts
em informática, treinados para detectar fraudes.
Um talento que ele transforma em arte, sem dúvida.
Claro, hoje ele pode pegar até oito anos de cadeia por
isso, mas eu duvido muito que isso aconteça.
Seria um desperdício.

Acabei remexendo em arquivos antigos e não resisto,
achei algumas coisitas antigas de que nem me lembrava,
e coloco aqui...heheheh...
Durante algum tempo, fiz alguns estudos e pintei nus, que
coloquei em algumas galerias, foi bacana. Aí estão:



Esboço para pintura, 1989.


Nu, 1989, 150x150 cm, aerógrafo
e acrílico sobre canvas. Galeria Alphaville.


O ateliê do artista plástico Herton Roitmann,
grande amigo, na rua Padre João Manuel, em SP, 1990.
Esta pintura está nos EUA, atualmente.


Marco Angeli, janeiro de 2009, ano 3

2 comentários:

  1. A tela do catador de papéis ao lado do muro no cemitério da Consolação não pertence mais ao André Bomilcar, que a deu de presente à sua namorada Leni.

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  2. Bacanissimos, tanto o texto quanto as imagens.

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