domingo, 27 de janeiro de 2008

DAVID LYNCH, iMovie, iBosta by Marco Angeli

Eu voltava do aeroporto, e parei como quase sempre no Graal,
para tomar café e ler o jornal no velho sofá vermelho.
Difícil eu não parar ali no final da noite, voltando pra casa...
Observo as pessoas, e leio o Estadão, coisa que normalmente
não faria no studio, por falta de tempo e outras cositas...
No Caderno 2 de sábado, 26 de janeiro, estava David Lynch
metendo o pau nos iThings...

Confesso que a cada vez que um amigo me mostra,
naquela telinha minúscula, alguma nova maravilha,
fico meio acabrunhado, meio sem saber o que comentar,
com medo de parecer antiquado e resistente
à esses novos gadgets digitais...e me calo sobre
minha teimosa insistência em não conseguir ver
quase que nenhuma utilidade naquilo que ele
me mostra com tanto orgulho...
Lynch diz, num comentário no You Tube:
'Se você assistir a um filme num telefone, nem
em um trilhão de anos irá desfrutá-lo a contento.
Você vai pensar que o desfrutou, mas foi engano seu.
É muito triste ver alguém acreditar que se possa
assistir a um filme na bosta de um telefone.
Caia na real!'

A matéria é de Sérgio Augusto, e óbviamente endossa
as palavras de Lynch.
Para quem não sabe, Lynch é um dos maiores e mais
respeitados cineastas de Hollywood, e um dos mais
polêmicos também...
Seus trabalhos incluem O Homem Elefante, de 1980,
Duna, de 1984, o genial Veludo Azul, de 1986, Coração Selvagem,
Twin Peaks e a Estrada Perdida, entre outros...e entre vários
curtas do início de sua carreira.
O mais interessante é que Lynch, contráriamente ao que
se possa pensar, é um adepto da tecnologia virtual e suas
maravilhas...seu último projeto, INLAND EMPIRE
(tudo em caixa alta mesmo)
que terá Laura Dern como protagonista, será filmado
inteiramente em digital...

Sérgio Augusto, em sua matéria, reflete sobre a
influência perniciosa que essa nova mania de se ver
um filme numa telinha de pouco mais de 8 x 6 cm,
com som que lembra muito os velhos radinhos de pilha,
pode ter sobre a indústria cinematográfica e sobre a própria
arte do cinema, que levou 113 anos para evoluir.
Eu, reconhecidamente, sou suspeito para opinar
sobre isso, já que adoro o velho cinema escuro e
a pipoca que obrigatóriamente o acompanha.
Talvez isso seja um anacronismo imperdoável. Talvez...
Mas eu, que fotografo, nunca consegui entender muito bem
para que eu usaria um celular que fotografa, normalmente
com péssima resolução...gosto de ver minhas fotos na
maior tela possível, observar a definição dos
fios de cabelos, e outros preciosismos mais...
Enfim, essa mania de criar canivetes suiços, com
um monte de utilidades num só iThing, pode resultar
exatamente no que Lynch definiu bem como
uma iBosta...porque nenhum deles irá funcionar
muito bem, será sempre um brinquedinho apenas.

Um alívio saber que pessoas como Lynch e Sergio Augusto
pensam como eu...e outro alívio saber que meu filho,
de apenas 11 anos, adora ir ao velho cinema comigo.
Com as pipocas inclusas, claro.

Marco Angeli, janeiro de 2008

sábado, 26 de janeiro de 2008

OTTOMAR PINTO by Marco Angeli

O retrato de Ottomar Pinto, governador de Roraima,
me foi encomendado por Fernando Santoro,
no final de 2007. A idéia inicial era a de ser um presente
para seu aniversário, em janeiro, mas Ottomar
acabou falecendo súbitamente no meio de dezembro.
Decidi colocar aqui a pintura desde seu início,
com algumas de suas fases.

Esboço inicial, na tela de 120 x 0,90 cm



Detalhe: Marluce Pinto, esposa de Ottomar e
primeira dama de Roraima

A pintura final, em acrílico sobre tela

Para aqueles que quiserem saber mais sobre a
carreira política de Ottomar, acessem
http://pt.wikipedia.org/wiki/Ottomar_Pinto.

Marco Angeli, janeiro de 2008



domingo, 13 de janeiro de 2008

COISAS QUE PERDEMOS PELO CAMINHO by Angeli

Fico pensando porque, cinéfilo assumido que sou,
nunca coloquei aqui nenhum comentário sobre alguns
dos filmes que me entusiasmaram.
A resposta, dentre tantas, não me ocorre,
mas sempre é tempo...


Halle Berry e Benicio Del Toro, profundos

Coisas que perdemos pelo caminho, ou
Things we lost in the fire, no original, provávelmente
não será um sucesso. Nem parece ter sido feito para isso.
Dirigido com sensibilidade por Susanne Bier, quase
uma estreante, tem a atuação simplesmente
impressionante de Benicio Del Toro e Halle Berry.
Uma reflexão sobre a vida, a morte,
a natureza do amor que aproxima e afasta as
pessoas, e como esses nossos caminhos podem ser
surpreendentes, inesperados...
As drogas, a morte, a fragilidade de nossas próprias
vidas...para quem, como eu, já se viu diante de
tudo isso e teve que, compulsóriamente,
pensar para sobreviver, e viver o dia seguinte,
e mais outro, um de cada vez, como diz o personagem
de Benicio...o filme é verdadeiro, profundo..
um pedacinho de nossas próprias histórias...

Os olhos de Berry, apaixonantes

Meu pai me dizia, me ensinando a desenhar,
que os olhos das pessoas são o reflexo do que elas
realmente são, mostram sua alma.
Atores, alguém já disse, atuam principalmente
com os olhos, não com palavras...
Nesse caso, Coisas que perdemos tem uma fotografia
intimista, maravilhosa pela sua luz, e seria um
filme perdido não fossem os olhos de Benicio
e Halle Berry, muito, muito além do script.





A história, comum em si, levada às telas dezenas de
vezes, serve apenas como suporte para o verdadeiro
tema deste filme...as pessoas e seu coração...
E os caminhos por onde andamos, por onde nos
perdemos e às vezes, nos encontramos.
E como lidamos com isso.


Talvez Halle Berry não seja a mulher mais bonita que
eu já tenha visto, como diz em certo momento o
personagem de Benicio Del Toro.
Mas - tirando os personagens de lado - ela é
com certeza a mais sensual, a que mais se aproxima
do conceito de mulher perfeita, inteligente, bonita,
de uma legião de marmanjos.
Eu, óbviamente, me incluo nessa legião.
Principalmente porque sou daquele tipo que se
impressiona com uma mulher primeiramente e
eternamente pelos seus olhos.
E os de Halle Berry são maravilhosos.

Marco Angeli, janeiro de 2008

MARIZA CUNDARI by Marco Angeli

Este retrato levou quase dois anos para ser pintado.
Mariza Cundari é arquiteta, trabalhamos juntos há uns
três anos, neste circuito Alphaville-São Paulo.
Há anos conversamos sobre retratar sua família,
vamos levando, na correria de sempre, e o tal retrato
ficava meio que engavetado, pra próxima.
Neste final de ano, eu fazia um trabalho para
o ex-prefeito de Barueri, Gil Arantes, nos encontramos
e conversamos novamente sobre a pintura.
E a oportunidade surgiu, finalmente.

A obra, 1.30 x 1.00, carvão e acrílico sobre canvas.
Luiz Cundari, Mariza e filhos

Claro que foi um prazer ter pintado essa tela,
acima de qualquer outra coisa.
Além de termos realizado juntos um trabalho muito
bacana, nestes anos, Luis e Mariza são duas pessoas
excepcionais, pelo bom gosto que tem, pela harmonia
com que convivem e trabalham, pela integridade...
É isso exatamente que esta pintura transmite.
O trabalho para Gil Arantes foi encomendado por ele
- o retrato da ponte Antonio Arantes,
que faz a ligação Alphaville-rodovia Castello Branco,
obra de seu pai.

Esboço para a pintura, no tamanho final de 1.80 x 1.00 mts

Estes trabalhos foram feitos em dezembro.
A pintura da família Cundari foi um presente feito
de surpresa pela própria Mariza, na noite de Natal.
Para mim, uma surpresa também, o telefonema do
Luis , na madrugada do dia 25 de dezembro,
emocionado com o retrato.

Detalhe: Luiz Pereira

De todos os retornos que obtenho com meu trabalho,
este, com certeza, é o mais importante e
mais gratificante, sem a menor dúvida.

Marco Angeli, janeiro de 2008




terça-feira, 1 de janeiro de 2008

2008, A NEW YEAR by Marco Angeli

Minha vida é cheia de imprevistos. Adoro imprevistos, na verdade.
Um desses me fez interromper a viagem que fazia e
acabar na casa de um grande amigo, no Pacaembú, em São Paulo,
no dia 31 de dezembro, quando 2007 finalmente terminava.


A avenida Paulista, ao lado, era uma tentação.
Há anos eu não via um ano nascer alí na avenida, que
sempre teve e terá um significado muito forte pra mim.
Chegamos a pé nos últimos minutos do ano que acabava.
Foi uma emoção estar alí novamente, ao som do Lulu Santos.

Primeiros instantes de 2008, eu e meu melhor amigo,
Victor Angeli, meu filho. Na foto deTchuka Ferraz.


Primeiros momentos, o ano acaba de nascer.
A avenida Paulista- como um enorme coração- começa
a pulsar marcando os minutos de um novo ano.
As pessoas vibram, é sempre uma emoção estar
alí, sentindo a energia dessa avenida maravilhosa.


Victor e Tchuka, o ano começa, finalmente...




Andamos por alí, nessa madrugada, e de repente me vejo
diante do prédio arruinado do que um dia foi o famoso
Baguette, em frente ao cine Belas Artes. Parei um momento,
imaginando se as pessoas lembravam ou sequer
sabiam que o Baguette havia sido um dos mais importantes
botecos dos artistas de São Paulo.
Imaginei que meu filho não saberia, claro, nem poderia...
Durante mais de uma década o Baguette havia sido o ponto de
encontro de todos os que perambulavam pela
madrugada da cidade, dos músicos aos poetas, dos pintores
aos malucos, dos que tinham grana e dos que não tinham.
Sob o comando de João Pedro, o Baguette era democrático.
Era um bar, apenas, e as pessoas lotavam aquele lugar sem
conseguir sentar, a madrugada acabando e o sol
começando a nascer alí no início da Paulista...
Eu subia a Consolação de moto, no inverno, num frio de
rachar, apenas pra terminar a noite no Baguette...

Alí conheci Plínio Marcos, conheci Herton Roitmann,
que havia desistido da direção do teatro do Itaú e
pintava suas telas mescladas com as colagens de gavetas,
portas de armário, todo o lixo que encontrava, e
transformava numa montagem genial...
Eu passava quase todas as madrugadas por alí, com a Jackie,
minha meio namorada e amiga do Allan, o negão que fazia
a segurança...um armário que realmente fazia com que
o lugar ficasse sossegado, sempre...Os que teimavam em
mudar essa ordem eram levados pelo meu amigo pra passarela
subterrânea que ligava aquele lado da avenida ao cine
Belas Artes, em frente, e tinham uma conversinha amigável
com ele...e a paz voltava, claro, ou o sujeito sumia.
Alí conheci e fiquei amigo de um professor de
História da Arte da Faap que acabou se suicidando em
seu apartamento por causa da AIDS que o consumia.
Alí marquei uma viagem de moto pra Recife que
nunca fiz.
Alí conheci e acabei namorando com a Cristina, mulher
eclética que não conseguia decidir se gostava mais
de meninos ou meninas.
Alí saí na porrada com um bêbado
(o Allan terminou com a briga, felizmente) por causa
da Adriana, numa madrugada. Um ano mais tarde
eu me casaria com ela, graças ao Baguette.

Memórias...o Baguette tinha um subsolo aristocrático
onde de vez em quando o Maschio, que era uma espécie
de personalidade cultural da cidade, fazia seus famosos
leilões de obras de arte e quinquilharias ditas
antiguidades...sempre e sempre envolvido em algum
evento beneficiente, principalmente para os hospitais
que se dedicavam a a tratar de pacientes com AIDS.
Doei com orgulho algumas telas minhas para esses
leilões, assim como todos os meus amigos...inclusive o
Herton Roitmann. Era uma festa.
Mas foi alí no Baguette, naquelas madrugadas, que minha
pintura tomou novo rumo. Em 1989, cansado do abstrato que
pintava, começou a nascer em mim o embrião de uma
mostra que faria em 1990, e que retratava a Paulista e sua
madrugada, com seus personagens etéreos e suas
luzes de neon...figurativamente, enfim...
A mostra foi um sucesso, algumas das obras estão, hoje,
no Shopping Paulista...e definiu minha pintura e meu
trabalho daí para a frente, até hoje...


Memórias apenas...que vieram nos últimos segundos de
um ano que terminava, e nos primeiros do que
começava...inevitável que fosse assim, com os pés
e meu coração alí, naquela avenida que me observa
divertida há tanto tempo, como observou outros, milhares,
que vieram e passaram...
Meu filho, ao meu lado, começando agora seu caminho,
ignorava completamente essas memórias...fascinado
observava os fogos que comemoravam 2008,
colorindo o topo dos edifícios...
Deixei de lado o Baguette e as memórias, finalmente,
abracei meu filho, meu melhor amigo -e botei o pé no
ano que estava começando, cheio de esperanças...

Muitos de branco: a esperança, já é 2008


A avenida, impassível, serena, aguarda o amanhecer
de um novo 1 de janeiro, como tantos que já viu...

Marco Angeli, 1 de janeiro de 2008