domingo, 16 de agosto de 2009

15 DE AGOSTO E A ESTÁTUA by Marco Angeli


Sábado, 15 de agosto.
A poucos metros de onde se realizavava, em São Paulo, a manifestação
pública pela retirada de José Sarney da presidência do Senado,
a estátua, muda e num imobilismo absoluto, esperava.



O perfil de José Sarney, escrito de forma
brilhante por Nelson Motta:

Um livro aberto
"A vida de José Sarney é um livro aberto,
que poderia dar um ótimo romance nas mãos
de um escritor competente.
A fabulosa trajetória de Ribamar, o cordial, que nasceu
nos cafundós do Brasil, tinha pretensões literárias,
e entra para a política, fica rico e poderoso apoiando a
ditadura militar e, por um golpe de sorte quase inverossímil,
se torna presidente da República
e membro da Academia Brasileira de Letras.


Masp, 15 de agosto, fora Sarney

Mas a história termina mal, quando o patriarca,
tentando salvar o filho das garras da Polícia Federal,
volta pela terceira vez à presidência do Senado
e se desmoraliza como pivô de uma crise sangrenta
e devastadora, quando o seu caráter e seus malfeitos
são revelados e o tornam símbolo do político
patrimonialista e atrasado que o País não aceita mais.




São Paulo, no Masp, sábado se sol

Um político que serve à ditadura militar durante 20 anos,
que preside o partido que a apoiou no Congresso,
que finge ignorar as prisões, torturas e assassinatos
cometidos pelo governo que sustentava por livre vontade
e puro oportunismo, e mesmo assim se diz um paladino
da democracia e se orgulha de sua biografia.
E tenta reescrever a sua história apostando na retórica e
na desmemória do povo, e na sua habilidade e falta de escrúpulos
para construir alianças políticas.
E quase chega a convencer, com sua imagem de
vovozinho amoroso e de homem educado, cordial e tolerante.
Parece García Márquez.
Bem escrita, poderia ser uma ótima história.
Como ficção, não biografia.




Caras pintadas em São Paulo

Ribamar, o personagem, não mente, faz ficção na política,
na administração e nas suas relações com o patrimônio público.
E as suas ficções são inverossímeis e sentimentais,
cheias de chavões e pieguices,
sua biografia imaginária não convence nem diverte
e nem emociona, como um livro ruim.
Vida e obra se misturam e se completam.




No Masp e na Paulista, 15 de agosto, contra a
permanência de Sarney na presidência do Senado.

Convocados pela net, manifestantes em São Paulo, Rio de Janeiro,
Belo Horizonte, Brasília, fortaleza, Florianópolis, Curitiba,
Goiânia, Belém, Vitória, Salvador, Recife e Porto Alegre
se uniram para dar um basta em Sarney.

Em seus delírios ficcionais, ele ainda imagina um happy end.
Mas nenhum editor aceitaria um final assim,
porque o leitor não acreditaria, ninguém publicaria.
Só a gráfica do Senado.
Mesmo assim ele vai à luta, em defesa do clã, e tem um
final melancólico, abandonado pelos aliados
que considerava mais fiéis: Lula, Collor e Renan."

Nelson Motta



Fui até a Paulista e fiz as fotos que estão aí.
À noite, conversando com um amigo, micro empresário, eu comentava
que a manifestação poderia ser muito maior,
como acontecia em outros tempos, quando ele me respondeu,
rápido no gatilho:
-Mas o que você esperava? Ninguém perderia uma tarde de sol
dessas com José Sarney. Porque ele é só mais um e todo mundo
sabe que assim que ele sair entra outro da mesma laia, corrupto
como ele. Não existem mais partidos, nem ideologia...
Pensei. E me lembrei da foto da estátua, que havia feito à tarde
desse mesmo sábado.



Muda em seu imobilismo. Esperando.
Mas esperando o que?
Em breve, mais dia menos dia, Sarney cairá e finalmente
descerá o elevador vermelho da política que o levará ao
andar de baixo, o porão, onde reinam faceiras figuras
carimbadas como o astuto e matuto José Dirceu e de onde vimos
ressurgir o desvairado Fernando Collor.
José Dirceu, inclusive, tem poder suficiente, lá do andar de baixo
mesmo, para articular, como articulou, a formação da tal
Tropa de Choque para manter o amigo Sarney.
É uma alternância de poder, onde sempre os mesmos
estão presentes, com um cuidado absoluto para
que ninguém novo entre.
O cheiro de mofo desse grupo, que está por aí desde os tempos em
que meu pai lia o jornal irado com suas peripécias,
agora se torna insuportável.


São Paulo, 15 de agosto

E está evidente nas palavras descrentes do meu amigo,
que na verdade estão na boca de todo cidadão deste país.
José Sarney é apenas o símbolo dessa decadência política
e moral, com seu apego ao poder.
A verdade é que é preciso renovação, novas lideranças.
Um vento novo, que varra a imundície incrustada há
décadas nas paredes do Senado e na vida pública do país.

Esse vento virá talvez (e a esperança é a última que morre)
do Amazonas, com o nome de Marina Silva.
É um sopro ainda, mas cabe à cada um de nós
fazer dele uma ventania capaz de afastar definitivamente
da vida do país nomes como José Dirceu, José Sarney,
Renan Calheiros, Fernando Collor de Mello e as centenas
de comparsas que engraxam a máquina que criaram.


Marco Angeli, 16 de agosto de 2009, 17 anos depois

Um comentário:

  1. Marina Silva, em cujas veias corre o sangue da floresta...poderia sim ser a unica saída. Tb acho isso Marquinhos. Conheça: http://marinasilvapresidente.ning.com/

    Bjs querido...

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