NATAL by Marco Angeli

Como todo artista civilizado, acabo de enviar meu
cartão de Natal. Um dever cívico, de todos os que
podem fazer isso, desejar um Merry Christmas pra todo
mundo. Até para inimigos e desafetos.

Não posso deixar, entretanto -como muita gente- de pensar
nos que não podem fazer isso.
Nem os demagogos ou os políticos mais sujos, nessa época, se
arriscam a pensar e externar seus pensamentos.
Melhor deixar de lado que para milhares e milhares de crianças,
pelo mundo afora, não existe Natal.
Nem educação, nem saneamento básico, nem saúde,
nem comida. Apenas sobrevivência, pura e simples,
onde a simples idéia de um Papai Noel gorducho
carregado de presentes é um sonho distante, impossível.
Fatalmente constato que para outros, menos sortudos
ainda, não haverá sequer uma chance.
Como o caso do menino João Roberto, de Isabella Nardoni,
de Eloá...e outros e outros...
Haverá por aí quem ache de extremo mau gosto tocar
nesse assunto. Principalmente neste momento.
Deve ser mesmo.
Provávelmente devo estar sendo vítima de minha consciência,
e pra piorar, na hora errada.
Ela -minha consciência- bem que podia deixar isso pra
depois, quando finalmente as festas, os abraços e as
confraternizações terminassem, como qualquer
consciência civilizada faz.
Afinal, é Natal, um Novo Ano está chegando,
vamos e podemos comemorar. Merecemos.

Mas, aqui no fundo, me importunando, desfilam
as imagens e os rostos das crianças nos semáforos,
limpando o vidro de meu carro.
Deixo quieto, vou comprar o presente para meu filho
e dou Feliz Natal para meu vizinho.

Marco Angeli, dezembro de 2008